Quem nunca ouviu sobre si, ou sobre outrem, alguém vociferar: “Mal educado, malcriado! Teus pais não te deram educação não?!” Estes termos geralmente são usados quando alguém é flagranteado desferindo palavras agressivas, falam com a boca cheia de alimento, comendo espalhando farinha por todos os lados, se comportando de maneira inoportuna, indelicada, acabando por ferir a dignidade e/ou moral de outrem. Mas, o que estaria por traz dessa afirmação? Quais seriam as verdadeiras consequências, para uma pessoa e/ou para a sociedade, quando a esta se negligencia a educação? E o que podemos fazer para que seja garantida uma educação que seja libertadora?
Ano passado recebi um convite para compor a equipe de coordenação da Campanha da Fraternidade. Fiquei muito feliz e honrado pois o tema tratado é: Fraternidade e Educação, e o Lema: fala com sabedoria e ensina com amor. Mas, por que esse tema novamente?
Esta é a terceira vez que a Campanha da Fraternidade aborda o tema da Educação. A primeira foi em 1982 com o tema: a verdade vos libertará. Naquela época o analfabetismo e o grande percentual de jovens sem acesso à educação eram as grandes preocupações. Em 1998, fraternidade e educação volta a ser tema da CF com o lema: A serviço da vida e da esperança. E agora, em 2022.
Levando em conta os desafios que a pandemia escancarou, tenho buscado refletir a educação dentro de uma visão integral do ser humano, ancorado no pacto educativo global do Papa Francisco, no qual ele convida o mundo inteiro a priorizar uma educação humanista e solidária como modo de transformar a sociedade, uma educação que foca na realização do projeto de vida do educando e, consequentemente, em um projeto de sociedade.
Quero estar enganado, mas vejo que um grande desafio para nossa Campanha, agravado ainda mais pela pandemia da covid-19, é alcançar o objetivo geral que é promover diálogos a partir da realidade educativa no Brasil, propondo caminhos em favor do humanismo integral e solidário. Para alcançarmos esse grande objetivo precisamos analisar o contexto da educação na cultura atual e seus desafios potencializados pela pandemia, verificar o impacto das políticas públicas na educação, identificar verdadeiros valores e referências em vista de uma educação humanizadora na perspectiva de um mundo onde todos vivam com justiça, dignidade e paz.
Em meio a todo esse contexto, somos provocados a nos questionar: qual o papel da família, da comunidade, da sociedade no processo educativo? Qual a colaboração dos educadores e das instituições de ensino? Quais propostas educativas ajudariam a promover a dignidade humana, a experiência do transcendente, a cultura do encontro e o cuidado com o mundo que é a nossa casa comum? Sabemos que a família é a base do processo educativo, mas não é a única instituição. Como reza o ditado africano, é preciso de uma aldeia inteira para educar uma pessoa. Ou seja, todos os atores que habitam a Mãe Terra, humanos ou não, fazem parte do processo educativo de uma pessoa.
Durante estes tempos de encontros, reflexões e estudos da coordenação da Campanha da Fraternidade, ficamos motivados a buscar estimular a organização do serviço pastoral junto as escolas, às universidades, centros comunitários e outros espaços educativos, afim de colaborar na promoção de uma educação comprometida com novas formas de economia, de política e de progresso verdadeiramente a serviço da vida humana em especial dos mais pobres.
Você concorda que a educação é o fundamento para a transformação pessoal, espiritual, política, econômica e cultural de um povo, de uma sociedade?
Oxalá que todas as escolas e centros universitários do Brasil inserissem a instigante e atualizada reflexão desta campanha, elaborada por mais de 200 especialistas, dentro das reflexões da semana pedagógica e consequentemente as inserissem no projeto político pedagógico para serem estudados e refletidos por todos os atores da comunidade acadêmica. Lembremo-nos que o tema da educação é transversal, vai além de qualquer instituição religiosa. Ela é um direito e um patrimônio da humanidade.
Lembremos que o tema da Campanha da Fraternidade deste ano foi precedida de duas importantes reflexões. Em 2020, quando estávamos apavorados com o início da pandemia, a CF trouxe o tema: “viu, sentiu compaixão e cuidou dele”. E no ano passado, 2021, num contexto de formação de gabinetes do ódio disseminando fake News sobre a vacina, sobre o vírus, misturado com a polarização esquizofrênica na política, a CF trabalhou o tema da fraternidade e diálogo, compromisso de amor, e o lema: “Cristo é a nossa paz, do que era dividido fez uma unidade”.
Por fim, que possamos celebrar no período quaresmal, verdadeiramente, este tempo precioso de Campanha. Que possamos viver uma espiritualidade encarnada semelhante ao modo de vida do próprio Senhor Jesus. Acredito que toda pessoa apaixonada por Ele jamais será indiferente aos problemas e sofrimento de seus irmãos e irmãs, ou seja, fará de tudo para ver acontecer o sonho de Jesus entre nós, que era e é ver todo mundo feliz, vivendo a abundância de uma vida digna, como irmãos e irmãs.
Bibiano Garcia é filósofo, professor da rede pública municipal. Ex vereador de Manaus e ex secretário executivo adjunto de educação. É Missionário Leigo Redentorista. Ministro extraordinário da Palavra e da Sagrada Eucaristia.